Histórico do Curso

 
O curso de graduação em Museologia da Universidade Federal da Bahia foi criado em 1969, sob a iniciativa do Prof. Valentin Calderón de la Vara, historiador e arqueólogo que também impulsionou a criação do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE-UFBA).  O Departamento de História da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas acolheu o novo curso para que pudesse funcionar, pois, naquele momento, a Museologia era tida como disciplina auxiliar de outros campos do conhecimento.
 
Nos anos 70 e início dos 80, a cidade do Salvador via iniciar-se o desenvolvimento industrial e também o turismo, então emergente, tendendo a valorizar o patrimônio arquitetônico e alguns aspectos do patrimônio cultural. A preservação dessas facetas patrimoniais foi compreendida como elemento fundamental para a identidade social, em particular a do nordeste brasileiro e ligava-se, assim, a um esforço para o desenvolvimento que marcou a região a partir dos anos sessenta. 
 
O primeiro quadro curricular do curso de Museologia apontou para a formação de um profissional voltado para atuar em museus cabendo-lhe o estudo e/ou identificação de coleções, com ênfase em tombamentos e inventários institucionais, conservação e montagem de exposições. Visando a formação complementar este currículo apresentava um elenco de disciplinas amplo nas áreas da Sociologia, Antropologia, Filosofia e História, configurando inserção aprofundada da Museologia nas Ciências Sociais, o que contribuiu para formação do aluno com uma visão mais ampla sobre as diversas realidades sociais.
 
Numa análise retrospectiva, realizada entre 1999 e 2000, os professores do Departamento de Museologia: Rosana Andrade Dias do Nascimento, Maria das Graças Teixeira e Marcelo Nascimento Bernardo da Cunha consideraram que, o currículo inicial dos anos 70 foi “[...] avançado em relação a outros congêneres existentes no País, pois apresentava um elenco de disciplinas bastante amplo nas áreas da Sociologia, da Antropologia, da Filosofia e da História [...]”. Configurava-se a inserção aprofundada da Museologia nas Ciências Sociais proporcionando ao aluno uma visão mais ampla de contexto balizado na realidade social.
 
O Curso passou por uma primeira reforma curricular, em 1979, quando foram ampliadas a carga horária e a creditação das disciplinas específicas, voltadas para a formação do profissional museólogo, e acrescentadas outras disciplinas com o objetivo de atender às especificidades regionais e do mercado de trabalho. Como conseqüência da regulamentação da profissão de museólogo, através da Lei Nº. 7.287, de 18 de dezembro de 1984, e do Decreto Nº.91.775, de 15 de outubro de 1985, realizou-se nova reforma curricular em 1989, fruto de debates com a comunidade museológica para discutir sobre o perfil do profissional, sua área de atuação, os avanços da Museologia e o papel dos museus na sociedade.
 
O resultado desta reforma estava relacionado aos movimentos internacionais na área de museus, especialmente na América Latina, que refletia sobre a ampliação da noção de patrimônio, à diversidade de museus, à incorporação dos anseios de comunidades e sua participação na modelagem de novas instituições. Tais movimentos podem ser apontados, de um lado, como frutos das angústias e repressões provocadas pelos governos ditatoriais da América Latina, dos anos 60 a 80, e de outro, como respostas ao movimento interno da Museologia, acionado pelo Conselho Internacional de Museus (ICOM/UNESCO).
 
A reforma curricular de 1989 foi influenciada por importantes documentos advindos de encontros internacionais, a exemplo da Carta de Santiago do Chile, de 1972, na qual foi firmada a noção de “museu integral”, com o fito de responder e incorporar questões geradas pela difícil situação da América Latina com países então sob ditaduras. Também foi importante a Carta de Quebec, de 1982, que apontava a necessidade de que a museologia se ocupasse de questões sociais em substituição à prática museológica centrada unicamente no estudo de coleções. Esse movimento inseriu novas idéias e conceitos sobre museologia que provocaram mudanças nas práticas museológicas e/ou surgimento de novas formas de museu: eco-museus, museus comunitários, museus de vizinhança, entre outras tipologias.
 
Em Caracas, 1992, foi concebida a noção de “museu integrado”, implícito na proposição de ações e processos que contemplassem as particularidades de contextos locais, apontando-se desafios aos museus, como as relações com a Comunicação, o Patrimônio, Lideranças, Gestão e Recursos Humanos. Abre-se o caminho para a qualidade da relação indivíduo e patrimônio, o reconhecimento coletivo, o estímulo à consciência crítica, dentre outros aspectos.
 
Como reflexo das discussões internacionais, novas adaptações ao currículo foram discutidas, por uma comissão do Departamento em junho de 1997. Dentre as preocupações que nortearam a proposta constavam as “exigências da ciência histórica bem como as demandas da sociedade brasileira” . Foi observada a necessidade crescente de dotar o museólogo de habilidades que o preparassem inclusive para a prática da investigação científica.
 
A discussão teórico-conceitual em torno da Museologia prosseguiu, e os documentos internacionais refletem suas mutações. Em 1995, no encontro internacional de Stavanger (Noruega), o foco das resoluções centrou-se nos museus e comunidades, na proteção do patrimônio durante conflitos armados, nas convenções para regular a integridade física e segurança legal da Herança Cultural, no treinamento para museus e na consciência global, no desenvolvimento das tecnologias de informação e, finalmente, nas recomendações sobre o uso indevido dos testes de armas nucleares. 
 
Em Melbourne (Austrália, 1998), as reflexões recaíram sobre os temas: diversidade cultural, museus e turismo, desenvolvimento regional dos museus, consolidação de atitudes contra o tráfico ilícito de bens culturais, proteção da herança cultural durante e após os conflitos armados e indicações para a convenção à proteção de bens móveis culturais como propriedade universal. 
 
Em 2001, no encontro em Barcelona (Espanha) discussões e documentos versaram sobre: a padronização de taxas dedutíveis para museus, responsabilidade governamental sobre museus e financiamentos (visando sua autonomia), busca por padrões legais para proteção da propriedade cultural e natural, estímulo para a disseminação da informação sobre a fragilidade de nossa herança, promoção e conscientização sobre as atividades de conservação, reforçando que o Patrimônio é vulnerável. Buscou-se, portanto, a tomada de consciência da obrigação moral para garantir o acesso ao Patrimônio, além do que se trata de direito dos povos à sua própria cultura e autodeterminação. 
 
Em 2004 (Seul, República da Coréia) foi emitida a Declaração de Seul do ICOM sobre o Patrimônio Imaterial, reafirmando a importância dessa modalidade de Patrimônio.
 
O discurso internacional  sobre Museologia reflete e retrata - da prática para a teoria e vice-versa -, a importância da dimensão social e política dos museus, a importância da ética no trabalho e dissemina princípios de experiências inovadoras sem ter neles modelos fechados como bem cabe a uma ciência social e não somente às ciências aplicadas. Vale notar a crescente produção bibliográfica nacional disseminada através de revistas impressas ou virtuais. No plano internacional consta-se o surgimento de editoras com títulos específicos em Museologia e Patrimônio, uma série em gestão cultural, além de periódicos há muito consagrados .
 
A reforma proposta neste momento visa ampliar o enfoque voltado para práticas de articulação e integração com o público e/ou diferentes comunidades, a democratização das informações contidas nos bens culturais, entendidos na sua relação com os respectivos contextos de produção e de apropriação.  Neste sentido, é entendido pelos docentes do Curso de Museologia que a formação do profissional museólogo, deve levá-lo a assumir seu papel na articulação e na expressão das diversas identidades sócio-culturais.
 
Projeto Político Pedagógico do Curso de Graduação em Museologia (2010, p. 3-5)